Que modelo educacional para uma formação intercultural de professores?
José de Sousa Miguel Lopes
Univ. do Leste de Minas Gerais, Brasil
miguel-lopes@uol.com.br
SÃO SIGNIFICATIVOS OS ESFORÇOS REALIZADOS NAS ÚLTIMAS DUAS DÉCADAS EM VÁRIAS PARTES DO MUNDO VISANDO CONSTRUIR UM REPERTÓRIO DE CONHECIMENTOS ESPECÍFICOS AO ENSINO. NUMEROSAS TAMBÉM SÃO AS REFORMAS BUSCANDO DEFINIR E FIXAR PADRÕES DE COMPETÊNCIA PARA A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES E PARA A PRÁTICA DO MAGISTÉRIO. NO ENTANTO, TEM-SE SENTIDO A FALTA DE UM CONJUNTO DE COMPETÊNCIAS QUE HABILITEM O PROFESSOR A ENTENDER E A LIDAR COM O DIFERENTE, A COLOCAR EM PRÁTICA UMA EDUCAÇÃO INTERCULTURAL.
O modelo educacional a desenvolver deverá ter em conta a função dos materiais escolares, o currículo, as políticas educativas e as atitudes dos alunos e professores quanto ao racismo, por exemplo. Trata-se de um modelo pensado não só para crianças de grupos minoritários, senão para «todos os alunos e para todas as escolas». Converter-se-ia desse modo, num suporte educativo que impregnaria a totalidade da vida escolar.
A organização deste modelo intercultural nos remete para uma questão central: trata-se de modificar a cultura escolar para que se propicie a igualdade de oportunidades de todos os grupos nela representados e o respeito á pluralidade, no interior de um marco democrático de decisões e de espaços de diálogo e comunicação entre os diversos colectivos sociais. Isto implica a inclusão no currículo de todas aquelas vozes ausentes dos conteúdos escolares: mundo feminino, mundo rural, cultura infantil, homossexuais, classe trabalhadora, pessoas portadoras de necessidades especiais, terceira idade, minorias étnicas e culturais. As culturas destes grupos têm sido sistematicamente excluídas ou banalizadas, descontextualizadas e estereotipadas, mantendo a visão da cultura dominante.
Ao professor do ensino básico se apresentam vários desafios. Um dos mais importantes é o da necessidade de ele contribuir para estabelecer uma ponte entre a cultura da escola e a de casa. Como facilitar a entrada, na sala de aula, de elementos culturais que são relevantes para os alunos? Em alguns casos, tenta-se utilizar a ponte para levar os alunos a substituírem a cultura de casa pela cultura dominante da escola. Noutros casos, utilizam-se as pontes de ligação para tentar ajudar os alunos a aprender a cultura da escola, mantendo, simultaneamente, a identificação e o orgulho pela cultura de casa.
O sucesso pedagógico que todos buscamos, não será resultante da combinação da capacidade de encorajamento ao sucesso escolar com a manutenção da identidade cultural? A reconstrução do conhecimento por parte do docente e dos alunos organiza-se a partir das «actividades», que são as que colocam de forma relacional o aluno, o professor e o conhecimento do currículo e estruturam dinamicamente a vida na aula. A partir de um enfoque intercultural, o professor se coloca no terreno dos conteúdos escolares que incluirão os processos e de interacção em sala de aula, gerando actividades que:
* propiciem a participação activa e a tomada de decisões dos alunos,
* potenciem o enriquecimento intercultural,
* se ajustem a distintas capacidades e interesses,
* se possam aplicar a outros contextos,
* permitam alcançar o êxito ou o fracasso,
* favoreçam a crítica e aperfeiçoamento progressivo,
* potenciem a planificação e o desenvolvimento em cooperação,
* comprometam pessoalmente os alunos na análise das próprias atitudes e valores, na busca de novas perspectivas compartilhadas.
Como organizar conteúdos programáticos concretos em ordem ao interculturalismo e dispô-los no interior das matérias curriculares tradicionais?
Será que poderemos falar de uma Didáctica do Interculturalismo a promover vigorosamente nas diversas instâncias da formação inicial e permanente de professores? O ensino da História e das Ciências Sociais não precisará de ser globalmente repensado a esta luz?
Será difícil reconhecermos que, em larga medida, esse ensino continua impregnado de vozes ancestrais e é instrumento de profundos ressentimentos que opõem comunidades e culturas vizinhas?
Estas questões estão em aberto e, para elas, se exige um envolvimento por parte de todos os educadores comprometidos com a acção educativa, em particular na perspectiva intercultural.