Diversidade Cultural e Educaçao
Por Fernando Albuquerque Costa. (pt)
Fernando Albuquerque Costa es profesor de la Facultad de Psicología y de Ciencias de la Educación de la Universidad de Lisboa.
El texto presentado está incluido en Contribuciones para el estudio y enseñanza del portugués en un contexto multicultural. Plantea el tipo de relaciones entre dos o mas comunidades que se articulan entre sí: perspectiva asimilacionista, segregación o «apartheid» cultural, mestizaje e integración pluralista. El texto valora el papel de la familia y el papel de la escuela en este apartado.
Como forma de se perceber a diversidade de relações que se podem estabelecer entre multiculturalismo e educação, começaremos por tentar fazer uma síntese do que, do ponto de vista social e funcional, são consideradas as principais alternativas de duas ou mais comunidades se articularem entre si. Utilizamos para isso a classificação proposta por CLANET (1990) que, baseando-se em aspectos de carácter essencialmente ideológico, distingue quatro perspectivas diferentes:
– perspectiva assimilacionista
– segregação ou «apartheid» cultural
– mestiçagem cultural
– integração pluralista
Numa perspectiva assimilacionista das relações entre culturas, diz-se que um determinado grupo cultural minoritário é assimilado, quando se torna semelhante ao grupo cultural dominante. Através de um processo de «deculturação» os membros pertencentes à cultura minoritária esquecem os traços da sua cultura de origem e, simultaneamente, adquirem os da cultura dominante.
Tem como base uma perspectiva ideológica que considera umas culturas superiores às outras e supõe um papel passivo das culturas mais fracas: muitas vezes, ao grupo mais fraco exige-se mesmo que adopte os traços do grupo dominante. Neste caso, uma das culturas elimina efectivamente a outra (ajustamento por eliminação). Na prática, no entanto, verifica-se que só alguns aspectos da cultura subordinada são eliminados em favor da cultura dominante (THOMAS, 1985).
Em termos de comunidades migrantes, culturalmente diferentes e minoritárias, portanto mais fracas, a forma de reacção a esta situação parece depender de duas condições: primeiro, que haja uma opção clara e vigorosa dos indivíduos candidatos à integração, de se inserirem na sociedade de acolhimento; segundo, que haja uma opção colectiva suficientemente clara e explícita da sociedade de acolhimento para reconhecer a identidade cultural própria e um estatuto de igualdade aos novos integrados.
Nnuma perspectiva de segregação ou «apartheid» cultural, predomina a representação de que cada conjunto cultural se deve desenvolver separadamente e de uma forma paralela, de acordo com as suas características próprias. Os grupos culturais coexistem num mesmo espaço mas com um mínimo de contactos entre si. Dado que cada grupo retém substancialmente a sua identidade cultural original e se desenvolve paralelamente com as restantes culturas étambém designada de acomodação paralela. Este tipo de ajustamento é ilustrado, por exemplo, com o caso de um país que adopta nas suas escolas duas línguas de instrução, sendo cada uma delas a língua materna de um segmento significativo da população, sem que nenhuma das línguas ou dos grupos étnicos seja dominante (THOMAS, 1985). Para o mesmo autor, uma forma menos dramática de ajustamento é a dominação. Neste caso, uma das culturas ensombra a outra, enquanto ambas se desenvolvem numa espécie de acomodação paralela embora irregular e mesmo desigual.
Numa perspectiva de mestiçagem cultural, prevalece a representação de que as culturas em contacto acabam por se misturar para atingirem uma síntese nova em que aparecem traços culturais inéditos. Para THOMAS (1985) pode falar-se de integração quando as duas culturas se fundem e formam uma nova cultura, que combina as características de ambas. No entanto, como o próprio autor chama a atenção, o que é mais frequente é o surgimento de uma espécie de «amálgama cultural» composta de uma dose muito maior de traços de uma das culturas em presença.
Finalmente, numa perspectiva de integração pluralista, édefendida a ideia da possibilidade de coexistência de grupos culturais minoritários no seio de um grupo cultural dominante. Trata-se, na opinião de CLANET, de um conceito de integração que «remete por um lado para a ideia de interdependência entre cultura dominante e culturas minoritárias e, por outro lado, para uma ideia de reparação, de recriação e de renovação… do sentido e da coerência de uma globalidade.» (p.64).
De acordo com THOMAS (1985), os diferentes tipos de ajustamento estão geralmente ligados ao período histórico em que são observados e têm frequentemente, um carácter transitório. Podem observar-se, muitas vezes, movimentos no sentido de um tipo diferente de ajustamento, ou mesmo a coexistência temporária de formas variadas.
Independentemente das formas que pode assumir a relação entre duas culturas, a decisão sobre se um elemento cultural exterior é ou não adoptado e o grau de generalização dessa adopção, pode ser influenciada por diferentes factores. Por exemplo, o poder que os «introdutores» de um determinado elemento têm para conseguir que as pessoas o aceitem e renunciem às formas tradicionais que se pretendem substituir; o grau com que o novo elemento vai de encontro à satisfação das necessidades dos indivíduos, quando comparado com a eficácia dos elementos tradicionalmente utilizados ou, em geral, as atitudes da população para com a inovação e/ou a manutenção da tradição (tais como o maior desejo em aceitar novas ideias em sociedades com uma larga percentagem de pessoas com uma «atitude favorável à modernização», comparado com a relutância em se aceitar importações culturais em sociedades dominadas por uma «atitude tradicionalista» (INKELES e SMITH, 1974; KAHL, 1968, citados por THOMAS, 1985).
Em termos de educação (formação) das crianças e jovens, podem encontrar-se reflexos destas diferentes posturas tanto ao nível das famílias – nas práticas educativas familiares – como ao nível da acção formal da escola propriamente dita.
Práticas educativas familiares
Para ilustrar os efeitos do multiculturalismo ao nível das práticas de educação das crianças na família, talvez seja relevante analisar o que se passa nas principais áreas em que os pais podem exercer influência junto dos filhos. Segundo THOMAS (1985), os pais podem exercer a sua influência de diferentes maneiras:
– através das atitudes que pretendem que os seus filhos adoptem em relação a elementos culturais de outras culturas;
– através das estratégias utilizadas para orientar ou controlar a acção que as outras culturas poderão ter sobre os seus filhos;
– ou, ainda, através da forma como reagem aos comportamentos concretos dos filhos.
Através das atitudes que pretendem que os seus filhos adoptem em relação a elementos culturais de outras culturas:
No que se refere ao primeiro caso e quer o façam intencional ou inconscientemente, os pais tentam influenciar continuamente as atitudes dos filhos sobre os elementos culturais. Sendo uma tarefa relativamente simples em sociedades monoculturais que, em princípio fornecem às crianças e jovens uma só opção cultural (uma só religião ou uma só língua), é uma tarefa bastante mais complexa em sociedades caracterizadas pela presença de mais de uma cultura, em que são várias as alternativas sobre qual a opção a adoptar.
Em qualquer dos casos, as atitudes típicas dos pais para encorajar os seus filhos situam-se num leque que vai desde o respeito igual pelas características dos outros, como pelas suas próprias, até ao sentimento de inferioridade face aos elementos culturais dos outros, que consideram superiores e que, por isso, procuram activamente adoptar. Podem também considerar as suas características culturais como superiores, embora aceitando que os outros mantenham as suas características ou, ainda, considerar as suas características como as únicas aceitáveis, vendo-se obrigados a dominar ou mesmo a eliminar as dos outros ou a exercerem influência sobre os outros para adoptarem as suas próprias características.
Através das estratégias utilizadas para orientar ou controlar a acção que as outras culturas poderão ter sobre os seus filhos:
Relativamente às estratégias para influenciar as atitudes dos filhos, são basicamente dois os processos utilizados, isto é, através de uma interacção directa com os filhos ou, através do controle sobre os filhos no que se refere ao acesso a outras fontes de influência e experiências culturais diferentes.
A interacção directa pode ser intencional, quando os pais impõem aos filhos como devem agir ou no que acreditar, ou quando deliberadamente os recompensam sempre que tomam as atitudes desejáveis e os punem quando acontece o contrário. Pode, no entanto, assumir uma forma inconsciente, quando os pais não pretendem deliberadamente posicionar-se relativamente a uma determinada atitude, mas denotam essa atitude, indirectamente, através do seu comportamento, por exemplo em termos de modo de vida, estilo de vestir, etc. Nalguns casos, porém, as instruções que os pais dão aos filhos entram em conflito com as atitudes que denotam através do seu comportamento. Isso provoca confusão aos jovens e pode originar desconfiança em relação aos conselhos dos pais.
Por outro lado, o controle sobre os filhos no que se refere ao acesso a outras fontes de influência e experiências culturais diferentes, tanto pode assumir facetas positivas como negativas. Um acto positivo dos pais pode consistir, por exemplo, em dirigir o filho para uma fonte de influência que promova a atitude desejada. Uma atitude negativa, pelo contrário, será, por exemplo, quando se tenta impedir a criança de contactar com fontes de influência que, de algum modo, a possam encorajar a adoptar costumes que os pais considerem indesejados.
Através da forma como reagem aos comportamentos concretos dos filhos:
Por último, mas não menos importante, até pelas consequências que isso poderá ter também em termos de intervenção pedagógica junto das famílias, é de mencionar o facto muitas vezes constatado de que os pais, por diversas razões (por exemplo a falta de informação ou sensibilização sobre a importância do seu papel na educação dos filhos), não tomam deliberadamente a iniciativa de agir sobre as atitudes dos seus filhos. A sua acção é geralmente exercida apenas em resposta àquilo que eles acreditam ser atitudes ou comportamentos impróprios e que portanto urge evitar ou eliminar.
Acção formal da escola
Mas, como se disse anteriormente, as influências do multiculturalismo também se podem observar ao nível da escola.
Tal como os pais, a escola pode proporcionar o acesso a várias opções diferentes ao apresentar culturas alternativas aos estudantes, ou pode limitar e dirigir esse acesso. Tal como os pais, pode promover atitudes de tolerância em relação a outras culturas ou fomentar e promover crenças de superioridade de uma cultura sobre as outras. Os mecanismos que o possibilitam são os mais diversificados, dos quais destacamos, por exemplo:
os requisitos de admissão aos diferentes níveis ou ciclos; as regras de comportamento dos alunos; a(s) língua(s) de aprendizagem utilizada(s); as medidas referentes à distribuição dos alunos de acordo com as suas diferenças individuais; os conteúdos curriculares (em particular o conteúdo das disciplinas de Estudos Sociais, História ou Geografia); a organização e conteúdo de manuais escolares; as formas de avaliação, etc. Para se ter uma dimensão do fenómeno ao nível educativo, será importante averiguar, entre outras coisas, quais os níveis relativos de sucesso e insucesso num determinado sistema escolar, das crianças autóctones e das crianças culturalmente minoritárias; que decisões específicas, por exemplo, ao nível pedagógico e didáctico são implementadas para facilitar a inserção desse jovens na escola; como é feita a integração e o ensino das línguas minoritárias; se existem e de que forma estão concebidos e são tratados os conteúdos programáticos relativos às «referências» sócio-culturais desses alunos, etc.
No que se refere propriamente aos professores, será também importante averiguar sobre a sua preparação global para o exercício de funções docentes numa situação tão particular como a que a presença de alunos provenientes de diferentes culturas implica. Indagar sobre o conhecimento que possuem sobre as especificidades relativas ao espaço sócio-cultural de origem daqueles alunos; de que formação pedagógica e didáctica específica dispõem para lidar com alunos cultural e linguisticamente diferentes e, finalmente, qual a sua atitude específica para com os alunos culturalmente minoritários, são alguns dos aspectos que podem ser considerados.
Torna-se também necessário averiguar e conhecer de uma forma mais específica todo um conjunto de situações relacionadas com o que as crianças «culturalmente minoritárias» são ou não capazes de fazer em termos do que a escola concretamente lhe propõe; mas também determinar quais os requisitos necessários (conhecimentos, atitudes e competências) para se funcionar eficazmente numa escola ou sociedade caracterizadas pela presença simultânea de mais de uma cultura.
A lista de questões passíveis de ser estudadas é grande, conforme o inventário de que TRUEBA nos dá conta e em cujas respostas talvez se encontrem pistas para a resolução de muitos problemas. É importante, por exemplo, saber:
Quais as capacidades e níveis de performance exigidas pelas actividades escolares?
Como é que a proficiência numa primeira ou segunda língua afecta a performance das crianças?
Quais os estilos de aprendizagem da língua das crianças minoritárias?
Como é que diferentes grupos linguísticos reagem às actividades propostas pelos professores em diversas áreas curriculares, por exemplo, nas actividades de leitura ou na matemática?
Como é que essas crianças se manifestam e reagem às dificuldades que sentem na escola?
Quais os problemas específicos com que se debatem no contexto das actividades escolares?
Que mudanças ao nível da classe ou outras lhes permitirão conseguir o máximo de realização com o máximo de satisfação?
O que é que professores e alunos poderão fazer de diferente de forma a conseguir-se uma eficácia óptima no processo de ensino e aprendizagem? (TRUEBA, 1989, p.2),
Em síntese pode dizer-se que, apesar da existência de diversas perspectivas de abordagem destes fenómenos, como veremos no ponto seguinte, parece haver alguma consistência e semelhança nas questões colocadas, situando-se as divergências mais ao nível das premissas e das metodologias de estudo do que em termos de metas ou objectivos. Questões como estas são, aliás, frequentemente consideradas como ponto de partida para diferentes estudos, mas com objectivos comuns e que globalmente visam uma melhoria dos níveis de realização pessoal, educacional, social e económica de todos os indivíduos independentemente da sua origem.
Contributos para o estudo do ensino do português em contexto multicultural. O caso do Luxemburgo, Lisboa,
Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa.
Fuente: Ensino do Português no Luxemburgo